terça-feira, 28 de dezembro de 2010

2011 e o Ocaso do Tempo


Acho que não existe.

O Tempo.

É um desses deuses pagãos inventados pelo escritor sem rosto.

Senão, o que seria?

Segundo a física, podemos dizer que é a volta que o planeta dá em seu próprio eixo, da aurora ao crepúsculo.

Ou a contagem de “estações do ano”, com proximidade ou afastamento entre a terra e o sol.

Com base nessas teorias, minha gradativa degradação física e mental é amparada na quantidade de “invernos” que testemunho.

Embora mesmerizado pelo dogma temporal e suas consequências, não consigo aceitar tão facilmente. Há conflitos.

Creio que nosso processo de envelhecimento é causado pela utilização constante da máquina, e não pelo contar de estações.

Alguém inventou isso de “tempo”, porque precisava de uma agenda. Precisava saber quando dormir e quando acordar, quebrar a naturalidade, cercear o instinto. Por causa dele, não se dorme quando tem sono, nem se acorda quando o corpo está descansado. A invenção do tempo nos adestrou a todos; o condicionamento te leva a deitar as onze, a obrigação te acorda às seis. Precisava determinar em que idade casar, quando ter filhos, quando deixar de usar roupa curta. Quando morrer.

É convencional, como tudo que nos cerca desde as cruzadas.

Pressa, rancor, sentimento de derrota, aprendizado ineficiente, alimentação ruim, serviços mal feitos, competição predatória, perda de boas oportunidades e grandes amores, nostalgia nociva, limitação do livre arbítrio. São exemplos do efeito maléfico do tempo sobre as pessoas e seus critérios.

Isso me faz lembrar que em poucos dias - segundo a física – mais um movimento de translação estará completo e adentraremos outro ano, 2011.

É hora de pensar que o tempo dogmático não passa de números em um calendário.

Que tudo passa, e independe de contagens. Portanto, nunca é cedo ou tarde demais para conjugar os verbos fazer, ter, sentir.

Que ouvir uma música e lembrar de um momento ou sentir um perfume e lembrar de alguém são os benefícios da memória, o melhor medidor cronológico que existe.

Hora de lembrar que o sentimento não envelhece.

Sim, a tristeza profunda ou a alegria esfuziante possuem o mesmo sabor aos 10 e aos 80.

As paixões humanas sempre causarão o mesmo desatino sensorial, independente da quantidade de estações vividas.

Um beijo carinhoso e um abraço sincero causam sensações boas em qualquer idade.

E existem locais no planeta onde não há aurora. Ou crepúsculo.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Últimos Filmes Vistos



















O Segredo dos Seus Olhos, de Juan José Campanella - Parece absurdo, mas esse filme me lembrou o coreano Old Boy (não sei se deveria ter dito isso, pode levar alguém a pensar coisas sobre o filme). Enfim, esse exemplar argentino que levou o Oscar de melhor filme estrangeiro equilibra-se de forma brilhante entre drama, romance e suspense, emoldurado por uma trama policial. Não é pouco. NOTA: A

Um Homem Misterioso, de Anton Corbijn - George Clooney parece determinado a caracterizar tipos solitários com forte tendência a mudar radicalmente sua vida pessoal. Antes era um consultor de demissões (Amor Sem Escalas), agora é um assassino profissional. É interessante observar o astro  carregando a trama nos ombros, mas o andamento contemplativo do fotógrafo e neo cineasta Anton Corbijn coloca tudo à perder para aquele espectador com sono atrasado. Falta ação e até diálogos nesse filme tão belo quanto vagaroso. Ainda bem que as boas atuações de Clooney e das suas lindas coadjuvantes européias combinam com o desfecho sem concessões, salvando programa. NOTA: C+

Machete, de Robert Rodriguez - Quem se divertiu mais esse ano, Sylvester Stallone ou Robert Rodriguez? Um colocou uma dezena de brontossauros matando uns aos outros no jurássico Os Mercenários; o outro colocou uma dezena de brontossauros mat... Enfim, é a mesma diversão, o mesmo cast curioso (um tem Dolph Lundgreen e Bruce Willis, o outro, Steven Seagal e Robert DeNiro) e muito tiro e sopapo gratuito. Machete é tão tosco quanto divertido, traz Danny Trejo como o herói e Steven Seagal como vilão. O desfecho do confronto entre os dois é sensacional: quem acompanhou o mínimo da carreira de Seagal vai chamar Robert Rodriguez de gênio. NOTA: B-

Os Outros Caras, de Adam McKay - Will Ferrel é o comediante da hora, o cara mais engraçado da américa, nem precisa fazer careta. E tem muita moral em Hollywood. Havia um tempo em que sua atuação cômica salvava filmes ruins como A Feiticeira, e parece que todos os produtores dos seus filmes seguintes estão apostando nisso. Mas não há como salvar bobagens como O Elo Perdido, Quase Irmãos e este Os Outros Caras, que só não traz a pior dupla de tiras atrapalhados dos últimos tempos porque Bruce Willis e Tracy Morgan tiveram a manha de trabalhar no terrível Tiras em Apuros. Como fazer um filme policial cheio de ação e com uma dupla engraçada sem Mel Gibson e Danny Glover? Eis a questão. NOTA: D

 




segunda-feira, 25 de outubro de 2010

TROPA DE ELITE 2, de José Padilha

Brasil - 2010 - Ação/Policial - 116min. Roteiro de Braulio Mantovani e José Padilha. Com Wagner Moura, Maria Ribeiro, Seu Jorge, Milhem Cortaz, Tainá Müller, Irhandir Santos, André Ramiro, Sandro Rocha.

A liberdade de expressão no Brasil é artigo de luxo. Não me lembro de nada relevante produzido com a exploração deste direito constitucional. Os rappers procuram se valer disso, mas dificilmente seu discurso ultrapassa as fronteiras do gueto. Nas raras exceções, o sensacionalismo diminui a contundência das denúncias. A mídia investigativa está no bolso de quem deveria ser investigado e só evoca o direito quando quer criticar por interesses próprios (basta ver as capas dos semanários nesta época de eleição e comprovar que imparcialidade jornalística não gera lucro).

Por isso, um veículo como Tropa de Elite 2 acaba crescendo em importância quando vê a luz do dia. Não serei ingênuo em acreditar que a mentalidade do mainstream nacional será afetada pela coragem de José Padilha, ou que os rumos políticos poderão sofrer algum impacto com o sucesso do filme. Seria pretensão demais para uma obra destinada ao entretenimento. Mas já me sinto aliviado que um filme nacional com apelo massivo tenha coragem para se aprofundar em um assunto abordado de forma superficial nos noticiários. Ainda que o selo "Globo Filmes" obrigue Padilha a incluir um aviso preliminar informando que tudo aquilo é "uma obra de ficção" - aviso este que pode ser interpretado de forma irônica no desfecho da fita.

Tropa de Elite 2 avança dez anos no futuro do primeiro longa para mostrar como o agora Cel. Nascimento será exonerado do cargo após uma ação desastrosa (para a política e os defensores dos direitos humanos) para conter uma rebelião na penitenciária Bangu I. Como o próprio personagem diz, é "uma queda para o alto": Nascimento é nomeado subsecretário de segurança pública do Rio de Janeiro, e transforma o BOPE numa "verdadeira máquina de guerra" (também nas palavras do próprio). Porém, com a queda dos traficantes, Nascimento é obrigado a assistir a ascensão das milícias formadas por PMs corruptos e toda a política macabra que as apóia em troca de votos.

Abordado de forma corajosa, os desmandos do comando da polícia e da secretaria de segurança transformam o primeiro (e ótimo) filme em um pequeno ensaio para o grande evento. Sim, acho que "coragem" é a palavra certa para definir o trabalho de José Padilha. Mais uma vez, seu roteiro se mostra panfletário em relação ao BOPE, mas a ferida na qual ele tem a manha de colocar o dedo o isenta de qualquer acusação absurda de propaganda fascista. O Brasil não precisa de heróis (mártires?) como Nascimento e Mathias? Por quem estes personagens incorruptíveis estão matando e arriscando as próprias vidas? São as questões que movimentam as quase duas horas de duração do petardo. Em determinado momento, ao abordar um dos poderosos beneficiados pela milícia, Nascimento nos coloca dentro da cena quando brada, aos tabefes, "se alguém da minha família morrer, eu mato todo mundo!" Não se envergonhe por gostar da cena, ela está no roteiro para atiçar seu sorriso sacana.

O CINEASTA
A cena de abertura - a violenta rebelião no presídio de segurança máxima - demonstra a capacidade de Padilha, incomparável nacionalmente, para encenar ação e violência: com a câmera sempre muito perto, cada gota de suor é registrada com realismo nauseante. E se a cena pede nervosismo, ela está nos olhos dos soldados do BOPE, na trilha sonora impecável e na frieza eufórica do Cel. Nascimento ("vamos deixar que os vagabundos se matem, depois entramos"). Todas as cenas de ação existem no desenvolver do enredo, nada é gratuito. Também não há personagem subestimado ou inútil. Seu roteiro é enxuto. Se podemos fazer comparações, a que caberia à José Padilha é com Michael Mann. Sem exagero. Não ficaria surpreso em ver seu nome atrelado a uma grande produção de Hollywood em um futuro próximo.

O PROTAGONISTA
O Cap. Nascimento é um ícone do nosso cinema e consagrou o ator que o interpreta. O desafio de Wagner Moura era caracterizá-lo dez anos mais velho, divorciado e longe do filho adolescente. E seu trabalho é sensacional. Utilizando apenas mechas de cabelo grisalho como artifício cenográfico, Moura emprega sempre um semblante que, se evita demonstrar resignação, traz um constante ar de cansaço e decepção por todos os anos de batalhas e perdas pessoais com resultados pífios. Inteligente, aparece sempre com os ombros arqueados para frente, como se o peso do mundo lhe estivesse às costas. O agora subsecretário de segurança pública participa pouco da ação, o que não impede que, quando o faça, pareça de fato empunhar armas e enfrentar bandidos há muito tempo. Moura atua com naturalidade e tem uma incrível noção do peso da história do seu personagem. Todas as frases contundentes proferidas por Nascimento pesam uma tonelada sob a credibilidade do intérprete. Sem dúvida, um trabalho formidável de um ator que entende o que é fazer cinema.

André Ramiro reprisa seu papel como o Cap. Mathias, agora sem a hesitação demonstrada no primeiro filme. E o elenco ainda teve a adição do ótimo Irhandir Santos como o adversário político de Nascimento.

Parabéns ao Padilha, que conseguiu superar as expectativas de criar uma sequência para um grande filme e ainda dar um passo adiante. Já que Paul Greengrass está fora de The Bourne Legacy, José Padilha seria o cara ideal para ocupar a cadeira principal do filme. Tony Gilroy, pede pra sair.
NOTA: A



quinta-feira, 7 de outubro de 2010

I Wanna Lay You Down In A Bed Of Roses...

O maior estádio da cidade estava lotado. Não imagino quantas mil pessoas. Quarenta? Cinquenta? Só posso arriscar que 80% do quorum era feminino.

O cara no palco, o maniac de jaqueta fechada, era a justificativa das garotas.

Quando conseguimos vencer seis lances de arquibancada para nos acomodar entre moças ensandecidas, a banda ainda esquentava a platéia com o hit "In These Arms", do grande Keep The Faith (1992). Jon Bon Jovi rebolava para manter sua pose sex symbol, vertendo gotas em calçolas ávidas por um desses, já que o rock'n'roll moderno não mais comporta frontman galã.

"Captain Crash", do Crush (2000), baixou a pelota, mas foi o tempo suficiente para nos estabelecer como platéia no estádio pulsante. Ao chegar atrasados no local, perdemos pelo menos dois clássicos: "You Give Love a Bad Name" e, putz, "Born To Be My Baby". Minha garota, que estava comigo, gosta desta última.

O show estava morno, Jon sorrindo. Um Richie Sambora inchado (mardita cana!) trocava freneticamente de guitarra a cada música executada. "When We Were Beautiful" do novo The Circle, tratou de manter tudo low profile.

Eis que Jon anuncia o retorno a 1984 e David Bryan inicia a tecladeira de "Runaway". Até eu resolvi cantar. Nem a nova "We Got It Going On" atrapalhou, pois logo os caras grudaram "It's My Life" e sequer foi possível ouvir Jon cantar o refrão, tamanha a voracidade com que o público devorou a letra. Com a pelota cruzada na área, "Bad Medicine" cuidou para que ela fosse para o fundo da rede. Minha garota concordava com as exclamações da garotada sobre a aparência física do frontman. O carisma do sujeito é inegável. E canta pra caralho ao vivo. Mas ouvir "liiiiiindoooooooo" em intervalos de 12 segundos fugia das minhas expectativas para o concerto.

No entanto, o que estava dentro das minhas expectativas também se concretizava. Depois de meter "Oh, Pretty Woman" e "Shout" no meio de "Bad Medicine" (que, acredite, ficou massa), Jon deixa Richie Sambora dominar o palco para cantar outro clássico do New Jersey, "Lay Your Hands On Me". Richie, guitar hero old school, também canta pra diabo. A turba se manteve cantando junto, e minha garganta já apresentava um gosto de lixa usada.

Então, Jon Bon Jovi retorna ao palco, para delírio das calcinhas em brasa. Tico Torres, batera caboclo, soca o kit na introdução de "Always" ("and I will love you, baby, always"), que Jon executa com figurino diferente do início do show. Ao fim da romântica (e bela) balada, com exibições de closes do vocalista nos telões, já me preocupava com a possibilidade do chão estar escorregadio.

Atendendo um pedido da minha garota, Jon anuncia "Blaze Of Glory", música do seu primeiro disco solo que serviu de trilha sonora para o simpático filme Jovens Demais Para Morrer (que fim levou Emilio Estevez?). Muito bom, solos sensacionais do guitar hero, "I'll Be There For You" começa. Balada master, dançada em bailinhos no fim dos '80. O agudo do vocal seria testado. Teste positivo.

A essa altura, eu só conseguia balbuciar as letras. Mas fiz questão de acompanhar o refrão grudento de "Have A Nice Day" daquele disco com uma "carinha feliz" na capa. "I'll Sleep When I'm Dead" manteve o rock'n'roll como prato principal, mesmo com a insistência da menininha à minha direita, com óculos de lentes quadradas, em gritar "lindo demaaaaaais"!

Com a platéia devidamente aquecida, um Jon Bon Jovi performático descasca a boa "Work for the Working Man", do disco novo, e junta "Who Says You Can't Go Home" do Have a Nice Day (já disse, o disco da "carinha feliz" na capa).

A sensacional "Keep The Faith" encerrou os trabalhos, e os seis caras desceram do palco para fazer xixi e cocô. Menos Jon, que deixou para obrar depois, já que era importante voltar para o bis de roupa nova.

Contrariando uma previsão macabra que fiz mais cedo, a banda mandou "These Days", do álbum homônimo de 1995 (o melhor disco da banda, me perdoem os admiradores do Slippery When Wet). Falando no álbum "escorregadio quando molhado" (sem alusão às fãs de Jon), os dois cabras à frente do palco iniciam os acordes de "Wanted Dead Or Alive". Foda-se minha goela.

"Someday I'll Be Saturday Night" e o clássico master, um dos estandartes do rock, a lendária "Livin' on a Prayer" dava números finais à saga bonjovística em solo paulistano.

Hã? Não?!

Vero, após poucos minutos de penumbra e os caras amontoados no palco a confabular, Jon se dirige novamente ao microfone, tudo se acende, e Richie inicia o solo de "Bed Of Roses". Era o que faltava para as tangas serem torcidas no caminho para casa.

Neste momento, eu estava sendo abraçado pela minha garota e meus amigos. O sino deu doze badaladas e eu comemorei, em tempo real, meu 34º aniversário, ouvindo um dos maiores frontman do rock sentenciar "I wanna lay you down in a bed of roses / For tonight I sleep on a bed of nails / I wanna be just as close as the holy ghost is / And lay you down on a bed of roses". Um "parabéns pra vc" meio macabro.

Thank you, Vivi. Thank you friends. Thank you Jon and Richie.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

ROBIN HOOD, de Ridley Scott

"Robin Hood" - EUA - 2010 - Épico/Ação - 140min. Roteiro de Brian Helgeland. Com Russell Crowe, Cate Blanchett, Max Von Sydow, William Hurt, Mark Strong, Oscar Isaac, Danny Huston, Kevin Durand.

A crítica jogou muita pedra nessa interessante abordagem sobre o herói fora-da-lei de Nothingham. Exagerou.

Ok, também não sei qual a necessidade de existir mais um filme sobre Robin Hood (para mim, a versão de 1991, estrelada por Kevin Costner, é a definitiva - desculpe, Errol Flynn), mas já que Scott se propôs a fazer, que tente percorrer um caminho original. E ele tentou.

Pena que, para Scott, original é chamar Russell Crowe com o mesmo penteado de Gladiador, utilizar as mesmas florestas deste filme e de Cruzada, convocar a mesma Cate Blanchett masculinizada de outros filmes, utilizar Mark Strong como vilão (clichê!) e dar a Crowe as mesmas falas de Gladiador e de Cruzada (Orlando Bloom fez as vezes na ocasião). Por causa deste parágrafo, não sei mesmo porque o mundo precisava de outra versão.

Não precisava; mas Scott fez, e apesar do parágrafo acima, criou um filme divertido, com um herói para torcer. Russell Crowe é um puta ator, ainda que insista em ser Maximus quando é Robin Hood. Culpa de Scott, que escala o mesmo ator para uma história semelhante (ambos mudam de identidade por conta de adversos quetais e buscam a redenção). O carisma de Crowe compensa a falha. Já para Cate Blanchett, preciso de uma explicação. Por que escalar uma atriz sem doçura alguma? Ponto fraco de O Curioso Caso de Benjamim Button, Cate especializou-se na heroína forte (Elizabeth) e não consegue se desvencilhar dela. Precisa fazer um reset, urgente.

A história é um prequel, e isso é interessante. Por que Robin Longstride tornou-se um fora-da-lei, um ladrão que distribui o produto do seu roubo? Está contado aqui. E é bacana.

Pena que o grande Ridley Scott tenha se especializado em se repetir. Tomara que ele abandone de vez os "épicos-com-batalhas-na-floresta" e faça mais filmes díspares, como O Gângster e Falcão Negro Em Perigo. Auto-indulgência destrói carreiras.


NOTA: C+

terça-feira, 14 de setembro de 2010

ILHA DO MEDO, de Martin Scorsese ("Shutter Island" - EUA - 2010 - suspense/drama, 138min). Roteiro: Laeta Kalogridis, baseado no romance de Dennis Lehane. Com Leonardo DiCaprio, Mark Ruffalo, Ben Kingsley, Max Von Sidow, Michelle Williams, Emily Mortimer, Patricia Clarkson, Jackie Earle Haley, Ted Levine, John Carroll Lynch, Elias Koteas.

"Someone is missing". A chamada do cartaz é genial.

Genial como o cineasta que realizou esta obra-prima, Martin Scorsese. Vc, que vai assistir o longa, bem-vindo a mais uma aula de cinema.

Ao contar uma história complexa - detetivesca, sendo os espectadores os responsáveis por seguir e desvendar as pistas - Scorsese escolheu o caminho nada óbvio do terror psicológico para descrever a investigação de Teddy Daniels (DiCaprio), agente do FBI encarregado do desaparecimento de paciente de uma instituição prisional para doentes mentais, localizada em uma ilha remota. Mas Daniels, veterano da 2ª guerra e viúvo trágico, possui tormentos suficientes para tornar a tarefa mais difícil à medida em conhece melhor a intituição, interrogando pacientes e funcionários do local.

Mais um filme de roteiro brilhante, realizado por elenco sintonizado com as idéias do diretor e cuja sinopse precisa ser revelada com cuidado. DiCaprio continua escolhendo muito bem em que filme trabalhar (além deste, a lista de seus últimos projetos inclui Os Infiltrados e A Origem, dois longas sensacionais) e entrega mais uma atuação impecável. Ruffalo tem nuances e detalhes que é impossível revelar sem falar demais. Aliás, os cuidados com que diretor e elenco espalham nuances importantes ao longo da projeção chega a ser tocante, pois percebemos a dedicação daqueles profissionais (Scorsese em destaque) para entregar um produto não menos que incrível aos pagantes de ingressos.

E tem cenas memoráveis; flashbacks fotografados com iluminação abundante, cores bem definidas (observe o amarelo do vestido da esposa de Daniels), e fotografia quase monocromática para as cenas bucólicas do presente, passando pela claustrofobia da instituição em si, mesmo em salas suntuosas (diga-se, auxiliado por um trabalho fantástico do diretor de arte, Dante Ferretti).

Novamente, seremos convidados a tirar nossas conclusões (a arte nos dá esse direito), mas diferente de A Origem, até os momentos que parecem existir para nos confundir soam muito esclarecedores ao final da saga. E podemos concluir que até o que parece imponderável depende unicamente das nossas escolhas.

NOTA: A

domingo, 12 de setembro de 2010

OS MERCENÁRIOS, de Sylvester Stallone ("The Expendebles" - EUA - 2010 - ação, 103min). Roteiro: Sylvester Stallone e Dave Callaham. Com Sylvester Stallone, Jason Statham, Jet Li, Dolph Lundgreen, Randy Couture, Eric Roberts, Gisele Itié, Steve Austin, Terry Crews, Mickey Rourke, Bruce Willis, Arnold Schwarzenegger.

É triste imaginar que muitos entrarão no cinema para assistir Os Mercenários esperando um roteiro originalíssimo, cheio de diálogos espertos, motivação política, ação e lutas exaustivamente coreografadas, atores em cabos, heróis realistas como Jason Bourne, atuações convincentes e efeitos especiais de última geração. Quem tiver esse tipo de expectativa, certamente não prestou atenção à escalação do elenco e ao plot do longa.
E será uma pena; tal expectativa o impedirá de apreciar a coragem de um artista em expor sua real natureza e homenagear suas origens. Sim, porque se Sly Stallone iniciou sua carreira com duas indicações ao Oscar por Rocky, O Lutador (ator e roteiro), foi como herói de ação que conseguiu sua fama e fortuna, além de milhões de fãs universo afora. Relaxe e curta os closes nos rostos enrugados dos musculosos em cena, closes estes que além de mostrar o contraste entre os "pés-de-galinha" e os músculos cultivados em anos de maromba e substâncias duvidosas, também super-dimensionam aqueles ídolos do cinema de ação; aprecie o encontro titânico entre os três maiores astros de ação que este planeta já viu: Sly, Bruce Willis e Arnold Schwarzenegger, em uma cena que, se curta demais para o tamanho do trio, expõe com bom humor o que é uma amizade de muitos anos (além de nos oferecer os melhores diálogos e piadas do filme).

Sly expõe a lembrança de uma época na qual os socos eram mais brutais e menos estilizados, as explosões eram reais e não criadas em computador, a        motivação para o herói era nada mais que a donzela em perigo ou a emoção da vingança. E mesmo que o enredo leve os brutamontes para um paiseco de terceiro mundo com intuito de enfrentar o tirano local, não há nenhuma motivação política. O personagem de Sly vai ao tal país para salvar a garota, não para "libertar o povo". Sly apanha e seus companheiros apanham, exceto Jason Statham, o único representante do "novo" cinema de ação. Curioso observar que seu personagem é o de maior destaque no filme, tem até um arco romântico (que vai se revelar mera desculpa para uma boa cena de luta). Statham é também um dos poucos, hoje em dia, que se pode chamar de "herói de ação", já que The Rock e Vin Diesel estão cada vez mais buscando a versatilidade, aceitando papéis em dramas e comédias.

Pena que Stallone deixou de explorar o carisma e habilidade de Jet Li, relegado a um personagem quase cômico, sendo ridicularizado o tempo todo por sua estatura e pedindo aumento de salário. Creio que Sly incluiu no filme algum tipo de piada interna, pois Li e Statham são os maiores cachês da produção. Incrivelmente, o longa também carece de um maior número de cenas de ação nervosas, explosões maiores, lutas com edição mais clara.

Com relação ao "elenco-porrada", faltaram apenas Van Damme e Steven Seagal para a nostalgia ficar completa. O primeiro não aceitou o papel porque "não queria fazer mais um caça-níquel com um personagem unidimensional" (em seguida, fez um papel quase coadjuvante no pavoroso Soldado Universal 3). Acho que Seagal nem foi convidado, mas está no elenco da outra tosqueira curiosa do ano, Machete.

Anacrônico de corpo e alma, Os Mercenários diverte muito e mostra que Stallone sabe como realizar suas fantasias na telona. O produto final é cheio de personalidade, cumpre todas as promessas de pré-produção. Ou alguém duvida de que cada idéia ultrapassada foi colocada no filme de propósito?


NOTA: B

terça-feira, 17 de agosto de 2010

A ORIGEM, de Christopher Nolan ("Inception" - EUA - 2010 - FC/ação/drama, 148min). Roteiro: Christopher Nolan. Com Leonardo DiCaprio, Joseph Gordon-Levitt, Ellen Page, Ken Watanabe, Tom Hardy, Cillian Murphy, Marion Cotillard, Michael Caine.

A obra de arte mais instigante é aquela na qual a interpretação cabe à quem olha, independente da idéia original do artista. E o artista mais completo é o que permite à visão do seu público o complemento da idéia inicial. Christopher Nolan é um artista, desses singulares que forjam obras de arte em sua profissão, como Amnésia, Insônia, O Grande Truque e, putz, O Cavaleiro das Trevas. Em todas essas realizações, seus protagonistas encaram dilemas morais. Em nenhum deles, a conclusão é imposta por Nolan.

Não poderia ser diferente no excepcional A Origem, onde um enredo básico de "filme sobre roubo" se torna uma verdadeira epopéia pela mente do protagonista - para ser mais preciso, pelo subconsciente, a área inatingível e incontrolável onde é armazenada a matéria dos sonhos.

A trama: Dom Cobb (DiCaprio, em mais uma grande atuação) é o líder de uma equipe que rouba informações do subconsciente alheio, mediante pomposos honorários. É a velha espionagem corporativa, versão Matrix. Afastado dos EUA e dos seus filhos por motivo que ninguém no mundo deve revelar a quem não viu o filme, Cobb aceita uma encomenda um pouco mais complexa: plantar uma idéia na mente de outrem (a tal Inception do título original), para receber o direito de retornar aos seus pequenos. Junta-se ao quadro a consciência de Cobb, em frangalhos por causa de uma tragédia pessoal - nada clichê, diga-se de passagem, pois se mostra essencial à rica narrativa que será apresentada - e os contratempos da própria tarefa. Falar mais que isso é canalhice.

Me impressiona muito a destreza de Nolan em dar importância a cada um dos personagens que farão o filme rodar. Ele lota a tela com eles, concede papéis importantíssimos a cada um e todos são essenciais para que o roteiro atinja seu objetivo (lembra do Bruce Wayne, Batman, Duas-Caras, Coringa, Comissário Gordon?). Em A Origem, todo mundo em cena é primordial. Inclusive Michael Caine, que fez pouco mais que uma ponta no filme. A escolha dos atores é outra prova do talento de Nolan. Leo DiCaprio, Ellen Page (nossos olhos e ouvidos no filme, é a "arquiteta" dos sonhos, chamada não por acaso de Ariadne), Tom Hardy (duvido que sua carreira fique na mesma daqui pra frente), Joseph Gordon-Levitt (grande ator em papel mais físico que o habitual), Marion Cotillard (tire os olhos da tela se conseguir), Ken Watanabe (excelente), Cillian Murphy (no ponto) e até o monstro Tom Berenger. Atualmente, não consigo traçar paralelos ao trabalho de Nolan nesse aspecto.

Todo o filme se passa no subconsciente alheio, e toda a ação está sujeita a este ambiente. Isso dá a liberdade que o todo diretor "sonha", correto? Mas este realizador não se limita ao óbvio. Não investe nos clichês dos sonhos ou pesadelos. Cria um verdadeiro mundo paralelo, tumultuado pela história do protagonista. Jogue uma pedra no lago...

Christopher Nolan é um realizador brilhante. E todos os seus filmes são brilhantes. Mas neste, em particular, ele entrou para o hall dos grandes artistas: aquele que leva o mesmo visitante pela segunda vez à exposição para confirmar se teve a impressão certa sobre obra à primeira vista.

Neste caso, amigo, talvez uma terceira visita seja necessária.


NOTA: A+

terça-feira, 3 de agosto de 2010

MOTORADIO SET LIST: TOP 11 - TERÇA-FEIRA

Volta às aulas. Em São Paulo, isso tem um significado: trânsito infernal. Ainda bem que o modo randômico do meu player também estava infernal...

01 - "Use Somebody" - Kings Of Leon (Only By The Night, 2008) - Rock puro, feito por roqueiros esquisitos. Mesmo com essas credenciais, é uma canção linda e... pop.

02 - "Nutshell" - Alice In Chains (Jar Of Flies, 1993) - O vocal inigualável do finado Layne Staley em um duelo de foice com o violão macabro de Jerry Cantrell.

03 - "Battle For The Sun" - Placebo (Battle For The Sun, 2009) - O Placebo não tem disco ruim. Essa canção é a melhor de um dos melhores plays de 2009.

04 - "Maver" - Stone Temple Pilots (Stone Temple Pilots, 2010) - O rock dos anos 90 - digo de novo, é meu preferido - está muito vivo. E os Pilots colocaram essa bela canção em seu disco de retorno.

05 - "Working Class Hero" - John Lennon (John Lennon/Plastic Ono Band, 1970) - Vocal, violão, melodia quase pedestre e uma letra contundente. O beatle mais genial precisava de mais em sua estréia solo?

06 - "I Believe" - Bon Jovi (Keep The Faith, 1992) - Eu gosto de Bon Jovi, ué! Esse som abre o excelente Keep The Faith com um hard rock de andamento diferente (para os padrões da banda) e um vocal variado (para os padrões do Jon).

07 - "It's Late" - Queen (News Of The World, 1977) - O riff de Brian May já faria da canção algo sensacional. Mas ainda coube uma melodia linda e o vocal sobrenatural de Freddie Mercury. Virou lenda.

08 - "Black Dog - live '72" - Led Zeppelin (How the West Was Won, 2003) - Clássico clichê, eu sei. Mas vc já ouviu essa versão ao vivo, gravada nos anos 70 em Los Angeles?

09 - "Shadow Of The Sea" - Screaming Trees (Ocean Of Confusion, 2005) - A guitarra grunge a serviço do vocal soturno e enfumaçado de Mark Lannegan!

10 - "Supernova" - Skank (Cosmotron, 2003) - Esse disco foi uma puta guinada musical na carreira dessa bandinha prioritariamente pop. O disco é muito bom, nem de longe lembra o Skank de Garota Nacional. Escuta a batera beatle desse som! Se o play fosse de alguma banda inglesa qualquer, viraria o hype da época.

11 - "Rain" - Creed (Full Circle, 2010) - Simplesmente não canso de ouvir essa música. "I feel it's gonna rain like this for days..."

ESQUADRÃO CLASSE A, de Joe Carnahan ("The A-Team" - EUA - 2010 - ação - 117min). Roteiro: Joe Carnahan e Brian Bloom. Com Liam Neeson, Bradley Cooper, Quinton 'Rampage' Jackson, Sharlto Copley, Patrick Wilson, Jessica Biel, Gerald McRaney, Brian Bloom. **=====** OS PERDEDORES, de Sylvain White ("The Losers" - EUA - 2010 - ação - 97min). Roteiro: Peter Berg e James Vanderbilt, baseado na HQ da DC/Vertigo. Com Jeffrey Dean Morgan, Zoe Saldana, Chris Evans, Jason Patric, Idris Elba, Columbus Short.

O problema de Esquadrão Classe A, o seriado, é que ele deixa de ser relevante para um ser humano tão logo este complete 15 anos de idade. Sim, aquela balela de explodir tudo sem que exista uma gota de sangue em cena tem prazo de validade. E não se trata de cinismo; não se via um soco, uma luta, apesar da força e carisma de Mr. T - o famoso B.A. Baracus. Pois bem, Esquadrão Classe A, o filme, também não investe no sangue - o projeto caro precisa lucrar, e lucro no cinema só é possível quando milhares de traseiros adolescentes estão nas poltronas. O filme foi caro, tem Liam Neeson politicamente correto, cenas de ação absurdas (eu gosto muito!) e protagonistas entrosados. Por que não é o filme de ação do ano? Bem, há uma série de explicações: a fórmula desgastou. Faltou culhão. B.A. está sorridente. Explicar o plano em flash back durante sua execução é um recurso batido. E o pecado capital: subestimou a presença de Jessica Biel, mostrando a garota sempre em trajes militares e de cabelo preso. Nhé.




Mas aí sim, fomos surpreendidos novamente! Os Perdedores, também lançado esse ano (ah, o timing de Hollywood...) tem a mesma idéia: equipe é traída, caçada, precisa arrebentar com o vilão e provar sua inocência. O cuidado nas escolhas determinou toda a diferença na qualidade: Os Perdedores é baseado em uma HQ cool (não em um seriado chato); tem cenas de ação menos exageradas e mais bacanas; é cínico, sensual, sanguinário e interessante; traz Jeffrey Dean Morgan se divertindo como um veterano (ok, o cara é veterano, mas só fez sucesso no cinema recentemente) e Jason Patric, o aborrecido Jason Patric, surpreendente como o vilão mais divertido da temporada. Mais? Chris Evans não está irritante e Zöe Saldana passa longe dos trajes militares.

Na comparação, Esquadrão Classe A é que sai perdedor.



ESQUADRÃO CLASSE A: NOTA D
OS PERDEDORES: NOTA B

quarta-feira, 21 de julho de 2010

MOTORADIO: RACIONAIS MCs - "Fim de Semana no Parque"


1993. O grunge de Seattle era o rock da época. No Brasil, pagodeiros dançantes enriqueciam depois de colocar suas caras e rabos rebolantes nos palcos do Gugu ou Faustão. Enquanto isso, um quarteto da periferia paulistana lançava um LP de rap que entraria para a história da música brasileira. Música?

Raio X Brasil seria mais uma tentativa dos Racionais de mostrar suas rimas para o maior número possível de pobres Brasil afora. Objetivo modesto. Porém, o petardo "Fim de Semana no Parque" ultrapassou a fronteira traçada por Mano Brown e chegou à classe média, após execuções maciças em "rádios pop", como Jovem Pan e Transamérica. O rap transbordava das rádios especializadas e invadia o território de Madonnas e Poisons. Nunca antes algo assim ocorrera com uma vertente musical periférica - ou "popular".

"No último natal Papai Noel escondeu um brinquedo
Prateado
Brilhava no meio do mato
Um menininho de dez anos achou o presente
Era de ferro
Com doze balas no pente"

Com esse nível de realidade nos versos, a batida seca cortada pelo baixo incessante e um vocal raivoso, Brown viu nascer seu primeiro sucesso e o reconhecimento de público e crítica. Suas atitudes desde então demonstravam que ele não perseguia aquilo. Queria mostrar sua música, viver dela. Mas não iria no Faustão. Quatro anos depois, os Racionais lançaram o lendário Sobrevivendo no Inferno, disco referência do hip hop nacional, frequentador assíduo de qualquer lista dos melhores discos brasileiros de todos os tempos. Vendeu 500 mil cópias originais e um sem número de CDs piratas (estima-se pela casa do milhão). Muito rapper de talento pôde se mostrar na cola de Sobrevivendo, que por sua vez, não existiria desmarginalizado sem "Fim de Semana no Parque". A parir dela, o rap brasileiro se afastou de vez do gangasta americano e elevou o status do rapper, finalmente reconhecido como artista.

Música? Sim, de qualidade artistica inquestionável.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

KICK-ASS - QUEBRANDO TUDO, de Matthew Vaughn ("Kick-Ass" - EUA - 2010 - ação/HQ - 117min). Roteiro: Jane Goldman e Matthew Vaughn, baseado na HQ de Mark Millar e John Romita Jr. Com Aaron Johnson, Nicolas Cage, Chloe Moretz, Christopher Mintz-Plasse, Mark Strong, Lyndsy Fonseca.

O nerd adolescente Dave Lizewski decide se tornar um super-herói simplesmente porque lhe pareceu uma idéia óbvia. Comprou uma roupa de esquiar pela internet, batizou seu alter ego como Kick-Ass e partiu para a ação. Em sua primeira missão, ele é surrado, esfaqueado e atropelado. Passa por procedimento cirúrgico que lhe confere placas de titânio para remendar os ossos quebrados e afeta seu sistema nervoso, a ponto de torná-lo resistente à dor. Depois de tanto sofrimento e meses em coma, que tal retornar à roupa de esquiador e fazer tudo de novo?

Kick-Ass é isso: o sopro de frescor prolongado que os gibis, antigamente relegados à caixas velhas de papelão, proporcionaram ao cinema nos últimos anos.

Matthew Vaughn assumiu a tarefa de conduzir um filme ousado. Partindo de um enredo crú e violento,  manteve em tela aqueles uniformes absurdos, coloridos, típicos de HQ. Ok, Alan Moore fez isso em Watchmen (a matriz de todos os heróis do "mundo real") e Zack Snyder o seguiu em sua adaptação cinematográfica, o que se mostrou uma ótima decisão. Mas Kick-Ass evita o quanto pode a caricatura kitch mostrada em Watchmen - O Filme, concentrando suas ações na ultraviolência gráfica, em cenas de fazer Cães de Aluguel parecer um conto de fadas. Por quê? Porque em Kick-Ass a princesa do conto está de espada na mão, mutilando, atravessando, esquartejando. E a princesinha se chama Hit Girl, uma garotinha de onze anos treinada pelo pai desde os cinco para se tornar uma máquina de matar. Mas ao contrário de Lizewski, que decidiu se tornar super-herói para enfrentar alguns "ismos" (egoísmo e niilismo, talvez), Hit Girl e seu pai Big Daddy (Nicolas Cage versão Academy Awards Nominee) são movidos por pura vingança. A curta cena em forma de quadrinhos que conta a origem da dupla é sensacional. A menina Chloe Moretz - Hit Girl - é espantosa de tão boa. Quando ela está em cena, é difícil prestar atenção em outra coisa. Por sinal, se a atriz não fizesse a personagem funcionar, o projeto iria pro espaço, já que atrás do rostinho angelical existe uma chocante e boca-suja assassina, que mata sem um traço de remorso e é vítima de agressões adultas que fará com que muitos conservadores desviem o olhar. Uma atriz menos talentosa não seguraria o refrão.

Clichê dizer que Hit Girl e Big Daddy são a melhor coisa do filme, a dupla inusitada. Não funcionaria sem a tal "química" entre Cage e Moretz, uma relação de pai e filha que mostra carinho e admiração em meio a armas, canivetes, socos e pontapés. Nic Cage, o paradoxal ator que, quando ganha muito dinheiro atua de forma preguiçosa (Motoqueiro Fantasma, O Vidente) e quando ganha pouco dinheiro, dá o máximo de si (O Beijo da Morte, Adaptação). Cage está em seus melhores dias: na primeira cena dos dois no filme, Big Daddy está dando tiros de pistola em sua filha, para acostumá-la com o colete de kevlar e a pequena dor que o balaço proporciona. "One more shot, honey". Eu acreditei na ternura do cara quando proferiu a frase absurda, instantes antes de efetuar o segundo disparo.

Mandando o "policamente correto" aos diabos, Kick-Ass apresenta uma violência gráfica marcante, geralmente perpetrada pela inocente figura de Hit Girl. Veja, estamos imaginando a existência de super-heróis na nossa realidade, portanto, não cabe a compaixão de Bruce Wayne ou Peter Parker aqui. Vilões matam. Portanto, Hit Girl e Big Daddy não fazem prisioneiros. Assim como o filme: o que precisa dizer, será dito; o que tiver de mutilar, será mutilado. A bazuca? Pode crer que será utilizada.


NOTA: A

domingo, 27 de junho de 2010

ATIVIDADE PARANORMAL, de Oren Peli ("Paranormal Activity" - EUA - 2009 - terror - 86min) Roteiro: Oren Peli. Com Katie Featherston, Micah Sloat, Mark Fredrichs, Amber Armstrong, Ashley Palmer.

O mestre do terror Stephen King é o maior nome contemporâneo da literatura do gênero por um motivo: sabe como ninguém criar terror e suspense baseados na sugestão, apostando sempre na imaginação do leitor. Outro mestre, William Peter Blatty, escreveu O Exorcista e criou o romance de terror definitivo, estabelecendo que as mais assustadoras histórias são aquelas que tem como inimigo o demônio - a personificação do mal difundida ao longo dos milênios pelas mais diversas religiões.

Pois Oren Peli realizou um filme que além de utilizar o cão como inimígo, reluta em lhe dar um rosto, criando um dos ambientes mais sufocantes dos últimos tempos. O enredo é simples: um jovem casal americano é atormentado por inexplicáveis acontecimentos durante suas noites de sono, e decide colocar uma câmera ligada no quarto enquando dormem. Dizer mais que isso é estragar o susto alheio.

A aplicação de um recurso nada novo - a câmera subjetiva, com a forte impressão de filmagem amadora - contribui para criar o clima de medo crescente ao qual o espectador é submetido desde a primeira noite gravada pelo equipamento. O filme todo é visto pelo ponto de vista do casal, com a câmera na mão. O ambiente perturbador se estabelece desde os letreiros iniciais do filme, que fecha também de forma terrível. Assista à noite, com atenção, e torça para ter bons sonhos.

NOTA: A

quinta-feira, 24 de junho de 2010

MOTORADIO: BUSH - "Glycerine"

Era início da década de 90 e o grunge mantinha o rock vivo. Na estrada desde 1992, a banda inglesa Bush só conseguiu lançar seu primeiro play, Sixteen Stone, em 1994, depois de bater, sem sucesso, à porta de várias majors e encontrar abrigo na Atlantic Records. Como a maioria das bandas surgidas após o estouro do grunge, os caras claramente seguiam os passos do Pearl Jam nas composições, até o vocal de Gavin Rossdale tinha momentos de Eddie Vedder. Isso gerou antipatia entre os e críticos, que foram quase unânimes na rejeição a Sixteen Stone e aos demais trabalhos do Bush. Porém, o público e a MTV, enebriados pelo rock de Seattle, aceitaram bem as guitarras distorcidas dos londrinos e o álbum alcançou grande sucesso nos EUA.

Longe de ser original, Sixteen Stone é um bom disco. Pesado, bem tocado e com produção tipicamente suja, o sucesso do álbum revelou coisas bacanas como "Machinehead", "Little Things" e "Comedown", mas o som que fica no ouvido é o de "Glycerine". Totalmente diferente das outras músicas do disco, "Glycerine" foi gravada tendo como base somente uma guitarra distorcida que emulava a batida de um violão, sem a inclusão de baixo e bateria. O pedal regulado do início ao fim na mesma distorção, sem a cozinha, o vocal rouco de Rossdale e um belo arranjo de cordas que faz toda a diferença no resultado final. Bela canção. Era o sopro de originalidade do disco, que ficou óbvia de tanta execução em rádios e MTV. Rossdale tentou copiar a fórmula nos álbuns seguintes, sem a mesma felicidade.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Pergunte “Qualquer Coisa” ao Clichê

Por KLEBERSON SOUZA*


Pensar semiprofundamente sobre o “que” escrever e duelar laboriosamente diversos sutis gladiadores vocábulos, até a previsível quaseconclusão de que a chamada realidade resume-se no “tudo” já apresentado (muitas vezes, admitamos, ignorado ou pisoteado pela praticidade dinâmica da globalização tecnológica) e, então, o criar torna-se transfigurar o mais tradutoriamente como que evidenciando o óbvio com adornos artísticos ou algo parecido. Eis a mais simplória consciência da não originalidade. Remostrar. Insistir. Sofrer sem pesar; o louco do agora, o ícone do porvir e o clichê do para sempre...

Irrmão, acho que fui religiosamente claro, não?! O mesmo assunto, saibam, renderia uma eternidade de visões e discussões.

Ainda não interpretei “Qualquer Coisa” nem de Caetano Veloso, nem de ninguém. Ainda bem!



* Kleberson Souza é meu irmãozinho. Camisa 10 habilidoso, músico, cantor, compositor, poeta, e filho caçula da Dona Alaide e Seu José. Te amo, neguinho!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

FADE OUT (chegou o momento de postar minha despedida oficial do mundo aon)


A morte é a única verdade absoluta.

Vivemos na possibilidade de partir a qualquer momento.

Então, por que diabos uma despedida é tão difícil? Já que o fim é inevitável, por que se despedir não é um ato instintivo, como se alimentar ou fazer sexo?

Estou redigindo este epitáfio há dias. Embora tenha plena consciência de que nada é feito para durar, tenho grande dificuldade em dizer “adeus”. Não consigo encontrar as palavras certas para descrever meus sentimentos ao deixar coisas pelo caminho. Mas a jornada é essa, não é? Ganhar, perder, abandonar, ser abandonado. Só esqueceram de incluir na Bíblia o treinamento para tanto. Mas tudo bem. Já passei por isso antes e passarei outra vez. Até conhecer a verdade absoluta.

Estive com vocês por 20 meses. Criei vínculos intensos com vários ao longo deste tempo. Fiz amigos. Pessoas que, mesmo que o contato cesse pelo ciclo natural das coisas, permanecerão por muito tempo na minha mente e retina. Posso afirmar que este período foi um dos mais prolíficos e enriquecedores da minha vida.

Em 20 meses, confirmei que grandes mudanças estão sempre a um passo – um passo! – de acontecer. Aprendi que é preciso coragem para dar esse passo, mas que nem sempre é covardia retroceder. Ser conseqüente está no lado bom da personalidade. Pratique.

Senti que a frustração presente sempre é maior que aquela superada. As recompensas do presente também são mais saborosas.

Confirmei que ao ceder algo bacana de mim a alguém, sempre há uma contrapartida.

Obrigado para quem me ensinou muito e para quem aprendeu algo comigo, sobretudo para aqueles que a troca de sabedoria foi natural e simultânea; para os iluminados que sempre souberam o que dizer quando eu estava puto; para os que souberam ficar calados quando sentiram que dessa forma me ajudariam mais; para os que aceitaram minhas conversas e brincadeiras; para aqueles que tiveram paciência de ouvir meus conselhos; para quem entreguei diariamente notícias de anteontem; para todos que precisaram de ajuda para incrementar o e-mail com alguma palavrinha esquisita ou para arrepiar um chato; para quem precisou de ajuda em um discurso, vejam vcs, de despedida. Agradeço aqueles que entendiam meu cinismo (alguns até achavam engraçado); a todos que não julgavam meu ceticismo; para os que me enriqueceram profissionalmente; para quem dividiu comigo mesa de bar e confidências; para aqueles que me deixaram fascinar por um tostão da própria vida, dividindo sonhos, opiniões, angústias, segredos, lágrimas.

Obrigado por me fazer rir muito. Eu ri demais com as cabocladas, as palhaçadas, as sacadas geniais, com o sarcasmo que nos motiva a sair da cama. Rir de nós mesmos é a melhor terapia, e muitos aí fazem isso com extrema competência.

Desculpem se fugi, se insisti, se agredi, se menti. Minha natureza intensa e inquieta me compele a cometer alguns excessos.

Às pessoas que magoei sem querer, me desculpem. Quem eu magoei conscientemente, espero que ambos tenhamos aprendido algo com o episódio.

Quem é meu amigo não deve encarar esse e-mail como uma despedida, pois sei que o contato será mantido. Atenha-se à parte dos agradecimentos e desculpas. Para os demais, quero que saibam que o convívio foi enriquecedor.
 
Muito Obrigado e muito boa sorte a todos.

Sentirei muita falta da convivência e das risadas.

Fade in.

terça-feira, 8 de junho de 2010

MOTORADIO - Soundgarden's "Beyond The Wheel", April 16, 2010 - Showbox Market Seattle, WA

Isso mesmo, 2010. Se duvida, olha as barbas brancas de Kim Thayil.

E não vou ficar com lenga-lenga de "porra, voltou finalmente!", "os caras são foda", "caça-níquel" e blá, blá, blá. Quem, como eu, se alimenta até hoje do rock de Seattle, sabe do tesão que é ver esses caras juntos de novo, fazendo shows e, putz, tocando "Beyond The Wheels" com requintes de crueldade. Foda-se se o aluguel ficou caro e Chris Cornell precisou capitalizar (é até piada dizer que o frontman do Soundgarden e Audioslave, autor de "Black Hole Sun", precisa de dinheiro), ou se sua parceria com o Timbaland o desacreditou perante a família (eu ouvi o tenebroso album Scream); o importante de verdade é ver o cara testando ao limite suas abençoadas (ou amaldiçoadas?) cordas vocais. E Cornell as utiliza com estupidez... Nesta versão ao vivo de "Beyond", o maluco vai do grave soturno ao agudo extremo em nano-segundos, sem fazer cocô no palco. E a melodia macabra, distorcida com extrema competência pela elétrica de Thayil nunca fora antes melhor executada. Matt Cameron... Ah, Matt, mothafucka, por que vc não toca deste jeito no Pearl Jam??? Se a qualidade do couro de gato do Soundgarden é melhor, leva caixas e bumbos pra garagem do Eddie!!!


Sensacional. Eu vi o show do Chris Cornell no Credicard Hall em 2007, e o cara se esgoelou por quase duas horas e meia. Bem afortunadas as localidades que receberem a visita do Soundgarden, versão retorno.

Aí está o link do vídeo.

terça-feira, 25 de maio de 2010

LUA NOVA, de Chris Weitz ("The Twilight Saga: New Moon" - EUA - 2010 - romance - 130min) Roteiro: Melissa Rosenberg, baseado no romance de Stephenie Meyer. Com Kristen Stewart, Robert Pattinson, Taylor Lautner, Anna Kendrick, Billy Burke, Ashley Greene, Michael Sheen, Dakota Fanning.

Parece que acabei de assistir 3 filmes diferentes: o primeiro, terrível, com um casal chato pra diabo: a garotinha com cara de dor de barriga e o garoto vampiro assexuado dizendo que precisa partir (inventa mentiras "originais" como dizer que a garota "não serve para ele"); o segundo, igualmente ruim, mas com efeitos bacanas, quando a garotinha (caprichando um pouco mais na cara de dor de barriga) descobre que seu amiguinho se transforma em lobo! E um lobo gigantesco, digno de filmes de... lobisomem! E um terceiro, o melhorzinho, quando uma família vampiresca, os Volturi, dá o tom das cenas. Mas é impossível: não há Dakota Fanning ou Michael Sheen que salvem Lua Nova, sequência de Crepúsculo, de ser um dos piores filmes da história. Os diálogos são risíveis, Kristen Stewart não sabe o que fazer e Robert Pattinson, o vampiro-adolescente assexuado de 109 anos, é de uma canastrice dolorosa. É constrangedor acompanhar as cenas "românticas". Caraio, estas não deveriam ser as melhores do longa? Todo o sucesso dos livros não está amparado no par "vampiro romântico e mocinha comum"? O problema é que Pattinson "vampiro romântico" dialoga olhando para o chão e beija com semblante de dor, enquanto Stewart "mocinha comum" entende que ser "comum" é ter cara de... dor de barriga! Coitado do Taylor Lautner (o amigo lobo), que está muito longe de ser um Marlon Brando, mas consegue dizer suas falas com naturalidade e demonstrar alguma emoção sem precisar olhar o chão ou fazer cara de...

Eclipse, que minha garota diz ser o mais violento da saga (não que os dois primeiros o sejam), será dirigido pelo mesmo David Slade do sangrento 30 Dias de Noite. Será que, além de caprichar no sangue, ele consegue fazer Kristen e Robert atuarem de forma minimamente suportável? Boa sorte, Dave!

NOTA: E

domingo, 16 de maio de 2010

CLICHÊ TOP 16: U2



Bono Vox acaba de completar 50 anos. Boa oportunidade para apresentar minhas preferidas da sua banda de apoio, o U2.

01 - "Stay (Faraway, So Close!)" (Zooropa, 1993)
02 - "In God's Country" (The Joshua Tree, 1987)
03 - "One" (Achtung Baby, 1991)
04 - "Wild Honey" (All That You Can't Leave Behind, 2000)
05 - "Original Of The Species" (How To Dismantle An Atomic Bomb, 2004)
06 - "Red Hill Mining Town" (The Joshua Tree, 1987)
07 - "With Or Without You" (The Joshua Tree, 1987)
08 - "Bad" (The Unforgattable Fire, 1984)
09 - "Walk On" (All That You Can't Leave Behind, 2000)
10 - "The Fly" (Achtung Baby, 1991)
11 - "Vertigo" (How To Dismantle An Atomic Bomb, 2004)
12 - "I'll Go Crazy If I Don't Go Crazy Tonight" (No Line On The Horizon, 2009)
13 - "New Year's Day" (War, 1983)
14 - "Who's Gonna Ride Your Wild Horses" (Achtung Baby, 1991)
15 - "The Electric Co." (Boy, 1980)
16 - "Bullet The Blue Sky" (The Joshua Tree, 1987)

segunda-feira, 10 de maio de 2010

LEGIÃO, de Scott Stewart ("Legion" EUA - 2010 - ação/terror - 100min) Roteiro: Peter Schink e Scott Stewart. Com Charles S. Dutton, Paul Bettany, Tyrese Gibson, Lucas Black, Dennis Quaid, Kate Walsh, Willa Holland

Puta bobagem apocaliptica sem base bíblica alguma.

É clichê demais: o estereótipo da mãe solteira está grávida de (quem mais seria?) o salvador da humanidade. Um bando de anjos que segue ordens de um Deus que "cansou dos seres humanos" (acredite, a explicação é esta mesmo) precisa matar o rebento, com mãe e tudo de preferência, e assim, destruir o mundo. Como alguém escreve um roteiro partindo de um enredo batido destes? Scott Stewart mistura referências ao bom Anjos Rebeldes com Terminator, dando uma passadinha por O Exorcista. E não estou elogiando o longa. E dá-lhe anjos possuindo corpos como demônios (!), sangrando e morrendo feridos por armas de fogo (!!!), tudo sem a menor cerimônia ou explicação. Paul Bettany e Dennis Quaid tiveram a manha de colocar a cara nesse filme. O aluguel atrasado, com certeza. E como a criança salva o mundo? Aposto que é crucificado, mas é melhor perguntar ao Scott Stewart - ou vc vai querer ver alguma continuação desta patuscada?

NOTA: E

segunda-feira, 3 de maio de 2010

FADE IN

- Bom dia!
Chego ao 6.º andar.
8h55.
- Ela já vem te atender.
Dois minutos. A garota aparece, blusa vermelha. Não usa óculos desta vez.
- Você precisa assinar alguns papéis. Trouxe a foto 3x4?
Claro que sim. Olheiras marcantes. Barba por fazer. Como agora.
- Seu plano de saúde. Preencha e assine, por favor.
Gentil, me ofereceu sua cadeira. Aceitei, desconfortável.
- Seu carro está no estacionamento errado. Não recebeu o e-mail?
Provavelmente sim.
- Se vc deixar neste, vai gastar um dinheirão...
Chego ao 4.º andar. Quase caio ao dar um passo em falso no banheiro. Um degrau de 6 centímetros, muito bem sinalizado com fita preta e amarela. Quem é minimamente observador não tropeça.
- Sua mesa, seu computador, seus papéis. Mas ainda não tem e-mail...
Meus papéis.
- Aqui é a máquina de café. É só apertar o botão.
Gostei mais do café analógico, feito na raça pela simpática copeira e mantido em uma garrafa térmica.
- Tem garrafas de água mineral aqui. Pode colocar uma na geladeira, se quiser.
Volto ao banheiro. Tropeço outra vez. O degrau de 6 centímetros. Preciso observar melhor amanhã.

O FUTEBOL BRASILEIRO AGRADECE


SANTOS F.C., CAMPEÃO PAULISTA 2010
Felipe
Pará
Edu Dracena
Durval
Léo
Arouca
Wesley
Marquinhos
Paulo Henrique Ganso
Robinho
Neymar
André
Dorival Junior

quarta-feira, 7 de abril de 2010

TÁ RINDO DO QUÊ?, de Judd Apatow ("Funny People", EUA - 2009 - drama/comédia - 146min). Roteiro: Judd Apatow. Com Adam Sandler, Seth Rogen, Leslie Mann, Eric Bana, Jonah Hill, Jason Schwartzman.

Sou condescendente com Adam Sandler. Confesso. Para apreciar os filmes do comediante, é preciso uma boa dose de condescendência. O estilo de Sandler é do “cômico bravo”, aquele que aposta no humor negro, no sarcasmo, na ironia e, vejam vocês, na raiva. É um comediante raivoso, mesmo quando o filme pretende ser leve. Essa raiva vem aumentando consideravelmente a cada filme, e nota-se também uma procura pelo drama (quem está lendo esse post assistiu Click ou Como se Fosse a Primeira Vez?). Pois bem: neste Tá Rindo do Quê? (título brasileiro idiota para o irônico e bem sacado Funny People) Sandler vive um comediante rico e famoso que se descobre com um tipo raro de leucemia. À beira do morte, o cara transfere toda a amargura para suas apresentações de "stand up comedy" e para suas relações pessoais. E, se em alguns filmes é possível rir com Adam Sandler, em Funny People isso é impossível, mesmo na companhia da sensação Seth Rogen, também em atuação desequilibrada. Judd Apatow, o diretor das comédias “sérias” e longas demais (seus filmes não tem menos de 2 horas de duração – quem está lendo esse post assistiu aos ótimos O Virgem de 40 Anos e Ligeiramente Grávidos?) exagerou na dose e não acertou em alvo algum; o filme não é triste a ponto de comover e não é engraçado a ponto de fazer rir. É um meio-termo macabro que não sai do lugar, nada acontece. É impossível não compará-lo com os dois longas citados, perfeitamente equilibrados entre comédia, romance e drama.

Só não dou uma nota “E” bem vermelha para o longa porque Apatow teve a manha de jogar na tela uma ironia cáustica, inerente à vida: a funny people do filme, composta por comediantes profissionais especializados no improv apreciado por platéias americanas, é uma gente mesquinha, mentirosa, melancólica e pobre de espírito. O americano gosta mesmo de rir das suas desgraças.

NOTA: D-

domingo, 4 de abril de 2010

CÓDIGO DE CONDUTA, de F. Gary Gray ("Law Abiding Citizen", EUA, 2009 - ação - 108min). Roteiro: Kurt Wimmer. Com Jamie Foxx, Gerard Butler, Colm Meaney, Michael Irby, Leslie Bibb, Regina Hall, Bruce McGill, Viola Davis.


Quando vi o trailer deste filme, fiquei muito curioso com a premissa: Clyde Shelton (Gerard Butler) tem mulher e filha assassinadas brutalmente, na sua presença, por uma dupla de assaltantes. O promotor público Nick Rice (Jamie Foxx) faz um acordo com o mais brutal da dupla: ele testemunha contra seu parceiro – que vai à câmara de gás – e tem sua pena reduzida. Com o acordo, o malaco cumpre apenas 3 anos e sai livre. Clyde, então, começa uma cruzada solitária – e violenta – para “punir” quem ele considera culpado e, principalmente, expor as falhas do sistema judiciário americano. Mais um filme comum sobre vingança, certo? Felizmente não: preso, Clyde faz todo o estrago aparentemente sozinho. Como?

Apesar de ultrapassar a linha tênue da verossimilhança (comum neste tipo de produção), F.Gary Gray consegue construir um filme tenso e sem maniqueísmo, e é competente ao colocar dois grandes atores em choque por dilemas morais. Já fez isso em A Negociação, onde Samuel L. Jackson e Kevin Spacey encarnam os personagens cinzentos. Em Código de Conduta, é difícil até saber para quem torcer. Parece que o “mocinho” é Foxx, porém, os mais cínicos tendem a enveredar pela justiça de Butler. Isso é o que torna o filme bacana, o caráter dúbio dos antagonistas e a forma como a trama é conduzida, sem tomar partido. Até velhos clichês são utilizados para dimensionar os personagens: a ausência de Foxx em sua família demonstra que sucesso profissional é sua prioridade. Portanto, o acordo virulento com o bandido jamais soa inverossímil ou exagerado. Falando em clichês, eu dispensaria o personagem misterioso que aparece apenas para dizer o quão perigoso Clyde Shelton é: àquela altura, tanto a platéia quanto o promotor Rice já estavam devidamente convencidos da periculosidade de Shelton.

Embora esperasse maior ousadia no ato final por tudo que o filme tinha apresentado até então, não fiquei totalmente insatisfeito, porque seja como for, a lição proposta pela trama foi aplicada: quando se trata de justiça, os culpados devem ser punidos, independente do que está escrito nos livros – ou de aspirações pessoais.

NOTA: B

segunda-feira, 8 de março de 2010

Orgânico ou Mecânico? Vivos.


Guerra ao Terror é o grande vencedor do Oscar 2010. Melhor filme, direção (Kathryn Bigelow), roteiro original (Mark Boal), montagem, mixagem e edição de som.

É o primeiro Oscar da história para uma mulher na direção. É mais um exemplo de filme independente (chamam assim nos States os filmes que custam menos de US$ 30 milhões) que ganha na categoria principal do mais badalado e cobiçado prêmio do cinema mundial. Porque não dá para ficar blasé diante do Academy Awards, por mais político, suscetível à lobby, antiquado ou conservador que seja.

E é um filmaço. Trata a guerra do Iraque por um ponto de vista original: a equipe anti-bombas do exército americano, pois este é o maior desafio nesta guerra idiota: impedir os atentados a bomba, única forma de resistência da combalida guerrilha iraquiana. A direção segura e criativa da ex-esposa de Jim Cameron segura a tensão na unha, pois não havia recursos financeiros para lotar o filme de cenas de ação. Optou-se, então, por colocar dois atores em ótima forma (Jeremy Renner, indicado merecidamente ao Oscar) e Anthony Mackie (uma indicação como melhor coadjuvante não seria exagero) em paradoxo companheirismo e discórdia: um luta uma guerra que é sua vida – Sargento William James (Renner), sendo “sargento” sua profissão e sentido da vida - o outro quer voltar vivo para casa. O que Kathryn Bigelow faz com esse enredo e estes atores semi-desconhecidos é algo impressionante. Merecido Oscar de direção.

O Oscar de best picture também caiu bem – o filme é ótimo.

Mas o espetáculo do ano, o longa a ser batido daqui por diante, a inovação, a ousadia, a beleza de difícil descrição, o encantamento imediato, isso é Avatar. O filme de James Cameron custou 25 vezes mais que Guerra ao Terror, mas dificilmente sairá da lembrança de quem o viu (principalmente em 3D). Não foi pirotecnia gratuita, o filme emociona. Os conservadores que me perdoem: para mim, Avatar deveria ser o principal vencedor da noite.

Guerra ao Terror: A
Avatar: A+

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Feliz Ano Novo!

Algumas constatações deste pós-carnaval. Eu disse "constatações", e não "descobertas". Exceto para arqueólogos ou caça-talentos, não é muito saudável fazer "descobertas" quando se tem 33 anos. Sobretudo no período do carnaval, quando Deus tira uns dias de folga na Noruega e deixa o Brasil sob os cuidados do demônio.

1) O novo disco do Wolfmother é do caralho;
2) O filme Se Beber, Não Case deve ser visto por todas as pessoas que estão pensando em visitar Las Vegas. E também por pessoas que gostam de 2 horas de entretenimento sem compromisso. Ei, não estou falando do banheiro do baile de carnaval!!!;
3) A banda Kings Of Leon é foda;
4) My Name Is Earl é o melhor sitcom americano de todos os tempos (sim, é melhor que Friends);
5) Nega Fulô também é gostosa quando não está gelada. E vende em restaurante japonês!;
6) Temaki é uma comida nojenta;
7) Shoyu mancha roupas brancas;
8) A monogamia presencial me poupou de ter dezenas de chances de contrair alguma doença terminal nesse período demoníaco. Devemos sempre ver o lado bom das coisas;
9) Mickey Rourke ainda é um bom ator;
10) Alguém nunca ouviu Arctic Monkeys? Do it!
11) These Days é o melhor disco do Bon Jovi;
12) Definitivamente, EU ODEIO as concessionárias VW;
13) O filme Distrito 9 é sensacional;
14) Utilizar o transporte público deixa meu humor mais ácido que a saliva do Alien.

Ok, confesso 1: não saí do raio de 2km da minha casa neste feriadão.
Ok, confesso 2: sou um nerd mothafucka.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

BESOURO, de João Daniel Tikhomiroff (Brasil, 2009 - ação/biografia - 95min). Roteiro: Patrícia Andrade e João Daniel Tikhomiroff. Com Aílton Carmo, Jessica Barbosa, Sergio Laurentino, Anderson Santos de Jesus, Flavio Rocha, Irandhir Santos, Macalé, Leno Sacramento.

Ser um bom contador de histórias não é fácil. João Daniel Tikhomiroff, experiente diretor de filmes publicitários, escolheu estrear em longas adaptando o livro Feijoada No Paraíso de Marco Carvalho. O livro narra a interessante história do Manuel "Besouro Mangangá" Pereira, lendário capoeirista do Recôncavo Baiano dos anos 20. Tikhomiroff tinha intenção de basear o enredo na capoeira e no heroísmo de Besouro, e contratou o chinês Huen Chiu Ku (coreógrafo de Kill Bill), para criar cenas de ação com cabos e proezas sobre-humanas.
Não deu certo.

 

De premissa ousada (basta ver nosso histórico cinematográfico recente), nada funcionou como deveria: o elenco não consegue dar credibilidade aos personagens; a montagem parece um amontoado de cenas; o herói não empolga, o vilão não apresenta desafio; o roteiro não desperta interesse em nenhum momento. A necessidade de explicar o “corpo fechado” do herói e sua devoção ao candomblé não se encaixa na narrativa. Também não se encaixa o triângulo amoroso entre Besouro, a mocinha Dinorá e seu amigo Quero-Quero. Além de ser um arco totalmente fora do contexto do filme, não há química alguma entre o trio de atores. A pá de cal: as cenas de ação, tão caras e essenciais ao enredo, são raras, enfadonhas e sem empolgação.

E o final, um anticlímax atroz, certifica que boas intenções, audácia e recursos não bastam para realizar um grande filme. Saber como contar a história ainda é essencial.

NOTA: D-