quarta-feira, 20 de março de 2013

GIBI: NÊMESIS, de Mark Millar e Steve McNiven

"Nemesis" (Marvel Icon - Panini Books) - Argumento de Mark Millar, arte de Steve McNiven e cores de Dave McCaig (2012) - 112 páginas

STORYBOARD NA BANCA
O sucesso cinematográfico de Kick Ass e O Procurado reflete negativamente na nova obra de Mark Millar

Kick Ass. O Procurado. Os Supremos. É difícil falar mal de um autor com um currículo desses. No entanto, Mark Millar se esqueceu do significado da palavra "adaptação" e, com Nêmesis, criou um storyboard para ser vendido em comic shops.

O sucesso das HQs mencionadas no início do post, igualmente bem sucedidas em suas transposições para o cinema (Os Supremos não foi adaptada literalmente, mas a idéia master por trás do filme dos Vingadores saiu de lá) não foi absorvido com clareza por Millar; ao realizar um trabalho de autor, desafia-se outra mídia - e outro autor - a adaptá-la para sua linguagem com competência suficiente para que sejam ambas bem sucedidas. Millar, cheio de pretensão e aparentemente sedento pelos milhões que seu roteiro há de render, escreveu cada linha descritiva, cada diálogo, cada reviravolta, como quem recebe uma encomenda para o novo filme de Michael Bay.

O gibi nasceu de uma idéia original: subverter o mito do Batman, no qual bilionário utiliza sua grana e tecnologia no combate ao crime e criar um personagem tão poderoso e inteligente quanto, mas que atua como supervilão. No caso, o único supervilão em um mundo sem super-heróis. Megalomaníaco obcecado por encontrar oponentes desafiadores, Nêmesis aposta suas fichas contra um veterano policial americano, com quem o vilão supostamente possui uma história passada. Talentoso e cruel, Nêmesis realmente seria um oponente difícil até para o Batman, fato que se torna o único atrativo da HQ: como um policial comum poderá combater tamanha ameaça?

Retratada pelo traço ágil de Steve McNiven com uma dinâmica, ahaamm, cinematográfica, o enredo  de ação ininterrupta tropeça na ganância de Millar em chocar gratuitamente, no caráter unidimensional de personagens que deveriam ser complexos e no amontoado de clichês típicos do cinema (como o vilão que se entrega propositadamente como parte de um plano e o pai ausente preocupado com a carreira). Aliás, olhando com atenção, percebemos referências à excelente HQ Skreemer, de Peter Milligan (1990), ao filme O Alvo, de John Woo (1993) e até um sopro de M. Night Shyamalan no final surpresa. Referências estas todas dos anos noventa, "a década do sombrio" para os fazedores de arte, década que parece ser musa inspiradora de Mark Millar. Adoro os 90 das guitarras sujas e vocais graves, mas se fosse Millar, prestaria atenção aos rumos que tomaram as carreiras de Woo e Shyamalan. A continuar escrevendo coisas como Nêmesis, suas HQs serão, de fato, adaptadas para o cinema por Michael Bay.

NOTA: 


terça-feira, 12 de março de 2013

LOOPER - ASSASSINOS DO FUTURO, de Rian Johnson

"Looper" - EUA/CHI - 2012 - Sci-fi/Ação - 119min. Roteiro de Rian Johnson. Com Bruce Willis, Joseph Gordon-Levitt, Emily Blunt, Jeff Daniels, Paul Dano, Piper Perabo, Noah Segan, Pierce Gagnon, Qing Xu.


A IGNORÂNCIA É UMA BÊNÇÃO
Natureza do vilão escondida até o terceiro ato e poucas concessões fazem de Looper - Assassinos do Futuro uma verdadeira pérola

"Há alguma coisa lá fora, nos esperando. E não é um homem. Vamos todos morrer."

Essa frase aparece lá pela metade do sensacional O Predador (John McTiernan, 1987), quando o personagem Billy (Sonny Landham) é questionado sobre o motivo do seu medo. Imagine que você nunca tivesse ouvido falar do tal alienígena caçador e estivesse assistindo ao filme sem a menor expectativa sobre a natureza da criatura que os soldados liderados por Arnold Schwarzenegger enfrentariam mais adiante. Frio na espinha, certo? Outro ótimo exemplo é O Sexto Sentido (M. Night Shyamalan, 1999). Sem a expositiva campanha de marketing, o "oooooooh" de surpresa que se ouviu no cinema quando se revela a natureza do personagem de Bruce Willis teria ocorrido uma vez antes, assim que Cole dissesse a célebre frase "I see dead people". Como seria se ninguém soubesse que o menino Cole via fantasmas antes de entrar no cinema, evidentemente o objetivo de Shyamalan ao conceber o roteiro?

Mas que diabos, é preciso vender os filmes. Principalmente os caros, que ficam mais caros exatamente por causa da campanha de marketing. E não adianta gastar tanto dinheiro e o espectador não se interessar em ir ao cinema, certo? Por isso, o excesso de informações em dois minutos de trailer. O triste é que, para muitos filmes, a divulgação precoce do enredo, trailers demasiado expositivos e o marketing agressivo enfraquecem a experiência do espectador. 

O que me traz a esse Looper, lançado há pouco em DVD/Blu Ray. Nas divulgações que vi, pouco da enxuta trama foi revelado. Evitei procurar muito sobre o filme, não li resenhas ou críticas. Soube apenas que Willis e Levitt interpretam o mesmo personagem em épocas diferentes, que são assassinos profissionais incumbidos de matar pessoas enviadas de trinta anos no futuro e que eles se encontram no presente do "Joe" mais jovem . Não fica claro se são aliados ou antagonistas, nem qual motivo traz o velho Joe ao passado. E quem é o vilão? Joe jovem? Joe velho? O chefe deles? Só é possível saber assistindo ao filme e, mesmo quando se descobre o personagem, ainda há outra surpresa envolvendo sua natureza. Isso é ótimo e, sem dúvida, causa um prazer adicional ao subir dos créditos.

Se a maquiagem de Levitt não é das melhores, com aqueles olhos exageradamente tristonhos, sua imitação de Bruce Willis até convence. A ação é bacana e correta, mas acertadamente não domina o filme. E Emily Blunt? Bem, Emily Blunt surge linda sem lobisomens ao redor e com uma missão mais difícil que a de Joe: ser mãe.

Willis, o astro de ação veterano mais respeitado do mercado (basta lembrar dos seus contemporâneos), entende que seu personagem tem mais camadas do que exige uma simples fita de tiros e explosões, e não faz feio. Sabendo tudo o que ocorre daquele momento passado até seu presente, o "Joe velho" precisa garantir a manutenção de um destino que ele já atingiu, mas desconhecido (e indiferente) para seu eu mais jovem. Por este motivo, o papel fundamental da trama cabe à Levitt: solitário e cético, ele precisa entender sua parte naquilo tudo em um curto espaço de tempo presente, sob pena de destruir não apenas o seu futuro, mas de toda a humanidade.

NOTA: 

Em tempo: esse trailer (o 1º divulgado) não entrega nada demais sobre a trama, apenas apresenta os personagens. Já o trailer 2 (que sabiamente assisti somente hoje, para escolher qual divulgar no post) indica pontos importantes da história, inclusive cenas finais do filme. Quem ingere muitos alimentos ricos em fosfato, não deve assistir antes de ver a fita. Como eu disse na resenha de O Caçador: em um mundo perfeito, as pessoas procurariam resenhas de um filme somente após assistí-lo.