quarta-feira, 21 de setembro de 2011

PEARL JAM TWENTY, de Cameron Crowe


"Essa será A BANDA dos anos 90", diz um alucinado Andrew Wood em espantosa cena inicial do documentário celebrativo Pearl Jam Twenty. Ele estava profeticamente certo, só não imaginava que sua própria morte seria o início de tudo.

Impossível racionalizar o bem estar que coisas abstratas do seu mundo são capazes de proporcionar. Coisas aparentemente simples, como estar de bem com sua família; se divertir com seus melhores amigos; curtir o som da sua banda preferida. Sua banda.

Quando sentei no lugar numerado na sala (sim, cinema com lugar marcado NO BRASIL), fiquei a observar a entrada dos sujeitos que pagaram para assistir o documentário de uma popular banda  americana que completa vinte anos de atividade. Tais sujeitos não pareciam ter vinte anos vida. Mas estavam lá, vários trajando camisas de flanela e usando rabo de cavalo. No cinema.

Eu acompanhei um bom naco da vida desta entidade em tempo real. Mesmo alheio ao seu íntimo, seu processo de criação e suas motivações, conseguiu me conectar com aquelas palavras cantadas em outra língua por um vocalista visceral e fraseados de guitarra hard-classic-dirty. O Pearl Jam é a minha banda.

E nasceu das cinzas do Mother Love Bone, banda de Andy Wood. Mostrado em cenas raras, Wood era um futuro rock star que morreu como tal antes de sê-lo. Seu baixista e seu guitarrista - Jeff Ament e Stone Gossard - seguiram em frente e fundaram um embrião de banda com um surfista de San Diego que enviou uma fita pelo correio. Por que as histórias de sucesso avassalador sempre nascem de forma romântica, alimentando crenças absurdas sobre destino e teorias imponderáveis?

Mesmo acompanhando o PJ em tempo real ao longo dos anos e conhecer boa parte das histórias e lendas nas quais o filme é baseado, é impossível não se emocionar com a compilação de imagens e depoimentos selecionados de alegadas 3 mil horas de material. A cronologia é organizada pela canção que acompanha a cena. Versões envelhecidas e grisalhas dos relutantes heróis contrapondo cabeludas faces joviais. Personagens importantes ganham voz. Kurt Cobain apresenta uma dinâmica no filme que arrefece a lendária rivalidade entre PJ e Nirvana de forma desconcertante. Chris Cornell, sempre de postura fria e distante, aparece mais de uma vez com olhos marejados em seus depoimentos.

Eddie Vedder, 46 de vida, mantém a timidez e os trejeitos do início da carreira. Seja em imagens atuais ou de arquivo, Eddie se mostra sempre introspectivo e desconfortável fora dos palcos. Também não aparenta resquício daquela energia incontrolável que o fazia pular sobre as costas dos seus parceiros ou escalar estruturas de palco durante os shows, comprovando que quando seus demônios internos não te matam, envelhecem com você. Eddie parece estar sempre se perguntando “por quê?”; nunca entendeu o status alcançado por ele e seus amigos de longa data, mas aprendeu muito bem como canalizar tal poder: fazer continuamente o que gosta e drenar uma garrafa de vinho por concerto. Quando aparece falando e mostrando fotos antigas, dá a clara impressão de ser alguém que poderia ser meu vizinho ou um colega de classe, mesmo nos dias de hoje. Provavelmente o convidarei para tomar uma comigo e meus amigos quando a turnê chegar a São Paulo.

Cameron Crowe, cineasta e jornalista talentoso, conhecedor de rock e fã da banda desde o início, foi o responsável por selecionar os momentos que entrariam na película. É considerado um amigo pelos caras, portanto, é meu amigo também. Tomou decisões discutíveis, como excluir o excelente álbum No Code do documentário, colocando apenas uma fala de Eddie justificando que o disco era o mais impessoal dos quatro gravados até então. Não alardeou que o Pearl Jam é a banda mais influente do seu tempo, mais que o incensado Nirvana, mais do que os astros do britpop. Decidiu sabiamente deixar a condução da narrativa a cargo da dupla que começou tudo, Ament e Gossard. Recheou o filme com canções memoráveis em versões inéditas e com aparições importantes (Neil Young, por exemplo). E destacou as idiossincrasias da banda, como a imprevisibilidade dos seus set lists.

Crowe capturou a essência do que é aquilo tudo. Uma banda que nasceu de um momento trágico e sobreviveu às falhas inerentes ao ser humano, inspirou milhões a curtir seu som com membros desprovidos de vocação para rock stars.  Celebrou com gosto os vinte anos da única banda do chamado "movimento grunge" que sobreviveu ao rifle de Kurt Cobain.

O filme conclui o que eu e milhões de seguidores desta entidade já sabíamos: não há grande segredo por trás do sucesso do Pearl Jam. É emoção pura. Coisas abstratas do mundo deles os mantiveram juntos, fazendo boa música com integridade, por muito tempo. São as coisas simples e irracionais, aquelas coisas que proporcionam bem estar.

É sua família. Seus amigos. Sua banda.



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