TONY STARK RISES
Shane Black joga Tony Stark no abismo e comprova que Robert Downey Jr. não precisa de armadura para encher os cofres da Marvel
Nunca ilustrei um post com três cartazes do filme resenhado. Porém, achei curioso o fato do trabalho de divulgação desse Homem de Ferro 3 desprezar categoricamente o símbolo maior do super-herói de gibi: a máscara. Em qualquer imagem que se vê nos cartazes oficiais, Tony Stark está sem o capacete. O óbvio motivo deste artífice é o tamanho alcançado pela figura de Robert Downey Jr. após vestir-se de de Tony Stark três vezes (dois Homem de Ferro e um Vingadores). Tamanho este que praticamente o libera da obrigação de estar dentro da armadura para agir de forma heroica nessa quarta aparição do personagem em cinco anos.
Após um início arrasador com o de filme de 2008, que divertiu o mundo com um roteiro enxuto e adaptou a origem do super-herói para a realidade pós-11 de setembro, o segundo filme apareceu como uma diversão pesada, indulgente e tão pretensiosa quanto seu protagonista. Tony Stark estava um personagem irritante, interpretado um tom acima pelo redivivo Robert Downey Jr.. Eis que, ao pensar o terceiro filme, a direção muda, e tanto roteiro quanto realização são passadas de Jon Favreau para Shane Black, bem sucedido roteirista de filmes de ação (para quem não sabe, Martin Riggs e Roger Murtaugh nasceram sob sua pena) com a missão de prosseguir a saga do vingador dourado após seu encontro com os Vingadores.
Para resgatar o herói da sua arrogância e aproximá-lo mais do público - e tentar colocá-lo em ameaças reais no processo - Black retornou ao básico: devolveu o playboy à caverna onde criou sua primeira armadura. Não literalmente, óbvio. O que ele fez foi removê-lo de sua zona de conforto e arremessá-lo em um mundo onde seu traje existe, mas não funciona na velocidade da suas tiradas sarcásticas. A cena de um Stark ferido e sozinho arrastando a armadura na neve com os próprios músculos ilustra magistralmente o caminho que o filme pretende tomar. Reparar a armadura em local ermo e com recursos mínimos, enfrentar o mais ameaçador vilão da trilogia, curar seus traumas nova-iorquinos e proteger a mulher que ama. Eis a missão.
Se o conteúdo é promissor e o enredo é estabelecido com maestria (a sequência da mansão sendo destruída, com todos os elementos envolvidos, é de cair o queixo), a forma deixou a desejar. Os vários furos incomodam (e a partir daqui, podem aparecer pequenos spoilers), como a facilidade com a qual Stark sozinho consegue encontrar o covil do vilão (o detalhe é que o pentágono, com ajuda intensa de James Rhodes, não conseguia) e o orgasmo múltiplo de amaduras que aparece no clímax do filme. Porra, quer dizer que Stark se desdobrou à toa para reparar a Mark 42 utilizando artifícios dignos de McGiver? O consolo é que a tal Mark 42 é um recurso importante para a trama, já que é a única armadura que Tony consegue controlar com a mente (via chips implantados no antebraço) e utilizá-la de várias formas. Mas se ele ainda guardava tantas armaduras no porão, qual o objetivo de apanhar sem um traje? E que tal o clichê de conectar herói e vilão a uma situação do passado? Também há uma solução envolvendo uma importante característica do personagem que, se não chega a comprometer toda a trilogia, incomoda bastante. E outros tropeços que não é possível descrever sem entregar demais sobre o filme.
A boa notícia é que para quem está simplesmente disposto a gastar duas horas de entretenimento digno de "gibi de super-herói", poderá se divertir muito. As cenas de ação são inventivas e espetaculares, e finalmente o Homem de Ferro sai na porrada com um vilão poderoso que não usa armadura; há surpresas bacanas e reviravoltas aceitáveis; Downey Jr. continua segurando a bronca, com a artilharia verbal calibrada; Gwyneth Paltrow está linda e muito melhor aproveitada que nos outros filmes; Ben Kingsley encara de forma corajosa e brilhante um personagem complexo, um vilão do nosso tempo; e Guy Pearce surge perfeito como a última peça do quebra-cabeça proposto por Black. Apenas Don Cheadle se deu mal, aparecendo pouco e sendo constrangido pelos buracos do roteiro.
Não poderia deixar de registrar: após anos de adaptações de quadrinhos preocupadas em soar realistas ao consumidor de cinema, percebo nos três últimos grandes filmes baseados em HQ uma sensível tendência dos cineastas em tratar a questão "realidade" com clichês da obra original, resultando em aventuras mais próximas do gibi. E, surpreendentemente, o precursor disso é O Cavaleiro das Trevas Ressurge, conclusão da seríssima trilogia do Batman de Christopher Nolan. Após o claustrofóbico O Cavaleiro das Trevas, Nolan relaxou no último filme e, não só permitiu traquitanas impossíveis (a "bat-nave") como deixou o vilão do filme explicar seu plano-mestre detalhadamente ao herói antes de morrer. Mais gibi que isso, só Joss Whedon, que vestiu seus Vingadores com os mais reluzentes uniformes quadrinísticos, colocou todos os heróis para sair na porrada uns com os outros e permitiu os exageros do "combate sem arranhão" travado com os capangas alienígenas. Shane Black seguiu a tendência em Homem de Ferro 3 e, além da velha explicação detalhada do plano de conquista do vilão, colocou mocinhos presos em armadilhas e mostrou antagonistas literalmente cuspindo fogo em cena.
Com apenas dois filmes como realizador, Shane Black precisa começar a se livrar das soluções fáceis e lembrar que o público dos blockbusters também gosta de linhas bem escritas.
Afinal, Robert Downey Jr. pode não estar lá na próxima vez.
NOTA: ✰✰✰✰✰
Amigo, assisti ontem o Homem de Ferro 3 e, lamentavelmente, erros se amontoam quase aniquilando o resultado final. Não sei por que insistem em resgatar o equivocado "Eu criei você", no que tange ao vilão, os inimigos tem que surgirem alheios aos atos do herói, como uma força da natureza. Ao contrário de você. não gostei do desdobramento da personagem interpretada pela Gwyneth Paltrow, pois, desta maneira, logo todas as pessoas ao redor do protagonista terão algum tipo de super poder, o que remete a lógica irreal do "Dr. House", onde todos os personagens, por pertencerem a mesma série inteligente, tem um conselho filosófico ou uma opinião que muda a vida, ou seja, sem espaço para as pessoas comuns que integram a realidade.
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