quarta-feira, 16 de setembro de 2015

INTERESTELAR, de Christopher Nolan ("Interestellar" - EUA - 2014 - 169 min) Roteiro de Christopher e Jonathan Nolan. Com: Matthew McConaughey, Anne Hathaway, Wes Bentley, David Gyasi, Topher Grace, John Lithgow, Mackenzie Foy, Casey Affleck, William Devane, Ellen Burstyn e Michael Caine.

Einstein, filosofia e... Deus?
Teoria da relatividade é espichada ao extremo no mais recente filme do diretor de O Cavaleiro das Trevas

Os temores da humanidade finalmente se concretizam. A superpopulação esgota os recursos naturais e chega ao fim o prazo de validade da Terra. Para evitar a extinção da raça humana, a NASA busca em outras galáxias planetas habitáveis para nossa espécie. Esse é o ponto de partida de Interestelar.

Na ânsia de parecer crível, o roteiro toma como base estudos de física quântica e ampara suas questões temporais na Teoria da Relatividade publicada por Albert Einstein em 1905. Mas não se preocupe: a trama parece rebuscada, porém, não há maiores complicações. Afinal, trata-se de um filme de Christopher Nolan e os diálogos existem para explicar tudo, e tudo outra vez - exceto o final do filme, como de costume (vide A Origem).

Ainda que pautado em questões científicas, o filme toma um viés filosófico sempre que o sensível elemento humano precisa interferir diretamente - seja quando Nolan decide incluir "amor" à mistura ou quando a ciência não consegue resolver questões impostas pela narrativa. Isso é bom, mas não justifica as decisões do realizador para concluir a história: em um final que destoa de toda a tentativa de realismo dos 150 minutos anteriores, a Teoria da Relatividade se torna "Teologia" da Relatividade, tamanho o esforço para amarrar a trama de forma circular se utilizando de elementos convenientes.

O triste nisso tudo é que, antes do ato final, Interestelar é um grande filme. Um mínimo de coerência narrativa e seria memorável.

NOTA: 


sexta-feira, 4 de setembro de 2015

AZUL É A COR MAIS QUENTE, de Abdellatif Kechiche ("La vie d'Adèle" - França - 2013 - 179 min) Roteiro de Abdellatif Kechiche e Ghalia Lacroix, baseado na história em quadrinhos "Le Bleu est une couleur chaude" de Julie Maroh. Com Léa Seydoux, Adèle Exarchopoulos, Jérémie Laheurte, Salim Kechiouche, Mona Walravens, Jérémie Laheurte.

MUSA INSPIRADORA

Diretor é acusado de odiar suas atrizes, mas evidentemente ama suas personagens


Azul é a Cor Mais Quente é um filme fascinante.

De narrativa fluida e sem o didatismo chato que subestima a audiência, o filme de Abdellatif Kechiche é um belo estudo de personagem somado a uma história corriqueira, uma saga de sentimentos confusos, desejos incontroláveis e impulsos inconsequentes típicos da... vida.

O enredo é simples: Adèle (a excelente Adèle Exarchopoulos), uma adolescente em plena exploração de seus desejos, conhece uma moça de cabelo azul (Emma, devorada por Léa Seydoux) e se apaixona por ela. O que vem à seguir é a vida como ela é, na sua mais artística representação.

Sem pudores, o realizador escancara seu amor por sua protagonista. Adèle tem a câmera colada no seu rosto, seu corpo e ações em cada frame. Ela está em todas as cenas. As peculiaridades mínimas da personagem são esmiuçadas pela câmera, como o jeito particular com que prende o cabelo ou a posição preferida para dormir; os lábios expressando descuido e curiosidade; seu imenso prazer ao comer algo simples como macarrão ao sugo. Esses elementos se repetem sistematicamente, pois serão explorados nas polêmicas cenas explícitas que Adèle protagoniza com Emma, onde cada idiossincrasia se torna um personagem a serviço das belas tomadas: os cabelos, os lábios, a fome.

Mais forte que o amor, fica evidente o desejo do cineasta pela personagem. A essência dos sentimentos, o mais básico instinto humano, catalisador de felicidade e de sofrimento, motivador do futuro de cada ser. Por isso, sua câmera registra com gana a mais curta lágrima que brota dos olhos da menina. Adèle é musa da artista plástica Emma, e também de Kechiche. Emma retrata Adèle em suas pinturas; Kechiche o faz em película.

Ainda que não ame suas atrizes, que reclamaram publicamente dos métodos agressivos do cineasta, Abdellatiff Kechiche é um apaixonado por suas personagens. Mesmo que, nesse belíssimo filme, elas sejam expostas ao crivo da realidade, e não às fantasiosas lentes de Hollywood.

NOTA: 

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

50%, de Jonathan Levine ("50/50" - EUA - 2011) Roteiro: Will Reiser. Com Joseph Gordon-Levitt, Seth Rogen, Anna Kendrick, Bryce Dallas Howard, Angelica Houston, Philip Baker Hall

MEIO A MEIO
Filme trata assunto delicado, emociona sem pieguice e diverte sem ofensas

Adam (Gordon-Levitt) está fazendo sua habitual corrida quando observa, em um cruzamento viário, o semáforo vermelho para pedestres. Mesmo sem nenhum veículo na via, o prudente rapaz aguarda o sinal abrir para que continue a correr. Na cena seguinte, vemos a preocupação de Adam diante da necessidade de utilizar um xampu diferente do que está habituado.

Mais dez minutos de filme, Adam será diagnosticado com uma espécie rara de câncer e passará a viver uma realidade onde a prudência no cruzamento da via ou o perfume do xampu são irrelevantes.

Embora seja um filme com embalagem leve, de elenco central jovem e Seth Rogen fazendo o de sempre, é impossível não se sensibilizar com a condição de Adam e sua dificuldade em levar uma vida normal.

Filmes sobre personagens doentes não precisam ser apelativos, e este não é. A questão aqui é o tema. No intervalo de três anos, vi essa doença devastadora levar dois membros imortais da minha família: mãe e sogra. No curto prazo mencionado, dois pilares das nossas vidas foram demolidos como que construídos com lego. A identificação com a narrativa veio na forma como tratamos o assunto antes que os organismos dos nossos entes queridos não suportassem mais: com carinho, com amor, mostrando presença mesmo estando longe, sendo realistas sem entregar os pontos. Parece imprescindível que seu ânimo esteja, no mínimo, cinco graus acima do da pessoa doente. Ela passa por tratamentos pesados que dificulta usufruir os maiores prazeres da vida, como comer ou fazer sexo. E tudo que ela precisa, sem pedir (ou sem saber) é de cumplicidade de vencedor, mesmo ciente da complexidade da situação.

Ainda que não consiga fugir dos estereótipos da mãe que sufoca e da namorada impressionável, o filme de Jonathan Levine procura destacar a atuação das pessoas que cercam o doente como profetas da saúde, e não reféns da doença. Não por acaso, a personagem mais complexa fica por conta de Anna Kendrick, que faz a jovem terapeuta de Adam. Ainda em treinamento, ela não consegue parar de vê-lo como um morto vivo e procura tratá-lo com técnicas genéricas. Adam, por sua vez, enxerga na moça um ser humano que também precisa de ajuda.


Como deve ser na vida, a narrativa não é sobre tragédias. É sobre a necessidade de conexão com as pessoas que amamos e a importância delas em momentos delicados. Como diz o título original, Fifty/Fifty: 50% de chance de morrer. Ou 50% de chance de viver tendo o prazer de não se arriscar no semáforo fechado. E de se preocupar com o tipo de xampu que lava seu cabelo.


NOTA: 


quarta-feira, 20 de maio de 2015

PÍLULAS: Últimos Filmes Vistos

Breves comentários sobre três filmes que vi recentemente. Cotações de 1 a 10.

VINGADORES: ERA DE ULTRON, de Joss Whedon (Avengers: Age Of Ultron, 2015, Ação/Quadrinhos)
O segundo filme da já anunciada quadrilogia não é tão bom quanto o primeiro. Culpa do excesso de personagens e da obrigação de concluir a chamada "2ª fase" da Marvel no cinema. Ainda assim, é empolgante e divertido. Com ótimas sequências de ação e outras nem tanto (Joss Whedon carregou na câmera parkinsoniana), tudo é maior e mais barulhento, inclusive os dramas pessoais de cada herói. Embora econômico em suas referências, é profundo nas mudanças que indica para o futuro.
Nota: 


SNIPER AMERICANO, de Clint Eastwood (American Sniper2014, Drama/Guerra)
Um grande filme, prejudicado pelo maniqueísmo e patriotada peculiares ao cinema panfletário americano. Eastwood foge de qualquer polêmica e cria verdades próprias ao contar a história do franco-atirador que mais vidas tirou no exercício da função. O fato de a guerra ter origem em uma mentira do governo Bush sequer paira sobre o roteiro de Jason Hall, como é ignorado o fato de que os "vilões" abatidos pelo atirador estavam defendendo seu território. Graças às habilidades do realizador e ao carisma do protagonista (Bradley Cooper, indicado ao Oscar pelo papel), temos um filme tenso e de narrativa atraente, ainda que moralmente discutível.
Nota: 


O ABUTRE, de Dan Gilroy (Nightcrawler, 2014, Drama/Suspense)
Inexplicável a ausência de Jake Gyllenhaal entre os cinco finalistas do Oscar. O ator está espantoso como o ladrãozinho barato que aprende a explorar o jornalismo "mundo cão" (sim, aquele de datenas e rezendes) vendendo imagens freelancers dos locais de acidentes e crimes violentos. Ao passo que adquire mais dinheiro e equipamentos, mais inescrupuloso se mostra o personagem na busca da exclusividade, da melhor "história". Um sociopata encontra um ator em grande forma. Filmaço.
Nota: