1993. O grunge de Seattle era o rock da época. No Brasil, pagodeiros dançantes enriqueciam depois de colocar suas caras e rabos rebolantes nos palcos do Gugu ou Faustão. Enquanto isso, um quarteto da periferia paulistana lançava um LP de rap que entraria para a história da música brasileira. Música?
Raio X Brasil seria mais uma tentativa dos Racionais de mostrar suas rimas para o maior número possível de pobres Brasil afora. Objetivo modesto. Porém, o petardo "Fim de Semana no Parque" ultrapassou a fronteira traçada por Mano Brown e chegou à classe média, após execuções maciças em "rádios pop", como Jovem Pan e Transamérica. O rap transbordava das rádios especializadas e invadia o território de Madonnas e Poisons. Nunca antes algo assim ocorrera com uma vertente musical periférica - ou "popular".
"No último natal Papai Noel escondeu um brinquedo
Prateado
Brilhava no meio do mato
Um menininho de dez anos achou o presente
Era de ferro
Com doze balas no pente"
Com esse nível de realidade nos versos, a batida seca cortada pelo baixo incessante e um vocal raivoso, Brown viu nascer seu primeiro sucesso e o reconhecimento de público e crítica. Suas atitudes desde então demonstravam que ele não perseguia aquilo. Queria mostrar sua música, viver dela. Mas não iria no Faustão. Quatro anos depois, os Racionais lançaram o lendário Sobrevivendo no Inferno, disco referência do hip hop nacional, frequentador assíduo de qualquer lista dos melhores discos brasileiros de todos os tempos. Vendeu 500 mil cópias originais e um sem número de CDs piratas (estima-se pela casa do milhão). Muito rapper de talento pôde se mostrar na cola de Sobrevivendo, que por sua vez, não existiria desmarginalizado sem "Fim de Semana no Parque". A parir dela, o rap brasileiro se afastou de vez do gangasta americano e elevou o status do rapper, finalmente reconhecido como artista.
Música? Sim, de qualidade artistica inquestionável.